sexta-feira, 31 de maio de 2024

O (bom) gigante (amigo) acordou: O Quinteto de Horace Tapscott.

 



Este álbum havia cruzado meu caminho internético uma vez ou outra, mas o fato de eu nunca ter visto o nome do pianista Horace Tapscott (nem de nenhum dos demais membros do quinteto) em qualquer lista de grandes jazzistas, nem mesmo em livros especializados, como o ótimo "O livro do Jazz", de Gunther Huesmann e Joachim E. Berendt (publicado no Brasil pela Perspectiva), me sugeria que se tratava de uma figura pouco relevante, que não merecia tanto minha atenção. O nome de seu primeiro e mais conhecido disco, "The Giant is Awaken", não ajudava, me fazendo torcer o nariz ao lembrar de alguns dos momentos mais desagradáveis da história recente do Brasil. Mas, afinal, o que Tapscott tem a ver com essas bobagens de 2013 ou 2018? Pelos comentários que li no rateyourmusic e pelas reviews citadas na página da wikipedia do álbum, parecia ser no mínimo interessante. Dois baixistas num quinteto? Piano rítimico a lá Thelonious Monk e Herbie Nichols? Por que não? 

Desde que dei play pela primeira vez no Qobuz, esse álbum não sai de rotação na minha cachola. De fato, soa bem de sua época, 1969, mas ao mesmo tempo há algo de único nas composições e improvisos
de Tapscott e companhia. Seu piano de fato lembra algo de Monk, especialmente na bluesística e tortuosa "For Fats", provavelmente dedicada a Fats Waller (mas que me remete nomeamente ao pianista de rock 'n' roll Fats Domino, cujo nome por sua vez sempre me fez pensar em alguém se empanturrando de pizzas da Domino's). Mas há algo de mais sutil e repetitivo, até hipnótico, em Tapscott (in how he taps his keys). Mesmo ao solar, ele deixa bastante espaço para seus companheiros, e por vezes seu piano parece funcionar como a sustentação para as músicas, ou o fluir de um rio que carrega um barco, sendo os demais instrumentos o verde escuro da mata à noite, que rodeia o corpo d'água, da qual por entre as folhagens olhos de corujas e outros bichos espreitam, produzindo ruídos inesperados mas harmoniosos, especialmente na faixa título. Não sei bem explicar, até porque entendo nada de teoria ou mesmo prática musical, mas há algo de misterioso nessas músicas. Me lembram os sonhos e tigres de Henri Rousseau. Talvez seja só o estranhamento desses improvisos e sons tortos porém compostos, às vezes indicando mais algo que sairia de uma Big Band do que de um quinteto avant-garde. Há algo de Monk e Nichols mas também de Ellington, talvez. E, de fato, alguns dos momentos mais memoráveis do álbum se dão no interplay entre os dois baixistas, enquanto um dedilha um solo, o outro é lindamente rasgado por seu arco.


E, pelo pouco que li sobre Tapscott e sua Pan Afrikan Peoples Arkestra, ele parece ter sido uma figura realmente memorável e única, que só não é mais conhecida e reverenciada porque não quis o ser. Enfim, um ilustre desconhecido.




oqueéumcabengo?


Há alguns anos (não sei quantos, a pandemia já destruiu minha noção de tempo) criei junto do meu amigo Lucas Almeida o casulosblog.com.br, com a ideia de ser um sítio eletrônico que funcionasse em parte como uma revista e em parte como blog. Contudo, venho há um tempo já sentindo a necessidade de ter um espaço mais individual e mais descompromissado onde possa regudigitar certas ideias, pensamentos, impressões, que me venham a cabeça. Algo como um diário, mas não pessoal, um espaço de anotações, que eu possa vez ou outra utilizar quando bem entender. Algo como o que já faço em minha conta do Letterboxd (@pedroavila), mas de maneira mais geral. Bem, acho que é o que chamávamos nos velhos tempos de "blog". Vamos tentar ver se isso serve de alguma coisa. Ando cansado de usar o Xuíter de Elon Musgo para soltar pensamentos perdidos ou recomendações/anotações sobre filmes, livros, álbuns ou jogos do Galo. Assim, posso também deixar o Casulos como espaço reservado para meus descompromissos mais compromissados, ou pelo menos mais ambiciosos, como por exemplo o texto sobre Ayako, do Tezuka Osamu, que nunca cheguei a postar (a primeira parte, em que trato do tema dos bonecos e duplos mais generalizadamente em sua obra: https://casulosblog.com.br/os-corpos-e-bonecos-de-osamu-tezuka-parte-1-por-pedro-avila/). Acho que o que tentei fazer com a coluna Sopa de Pato (https://casulosblog.com.br/sopa-de-pato-1/) era algo parecido. Mas como o Casulos funciona revisticamente, ou seja, periodicamente lançamos diversos textos e imagens (leia-se de vez em nunca (apesar de que queremos voltar a ser mais regulares)), fica meu CabengoCabengo como reserva onde colocar avulsividades que me venham na telha por compartilhar. Por que "cabengo"? É meu pseudo-psudônimo há algum tempo, apesar de nunca ter usado em nada sério (é de onde vem meu arroba de instagram, que muitos confundem: @pcabengo (por diversas vezes já me perguntaram se meu sobrenome é "Bengo", ou se meu nome é algo como Pedro C. Ávila Bengo, como se "pca" fosse uma sigla). O nome vem de uma história real, de duas gêmeas, nascidas em 1970 na Georgia, não a comunista, cantada parodicamente por Paul McCartney, mas a capitalista, cantada por Chuck Berry e Ray Charles. As duas irmãs, oficialmente batizadas de Grace e Virginia Kennedy, passaram alguns anos de sua infância se recusando a aprender inglês, tendo desenvolvido uma quase-língua particular, na qual seus nomes respectivos eram Poto e Cabengo. Uma história que me fascina, claro, uma vez que tenho um fascínio por linguística e uma irmã gêmea. Há um bom documentário sobre o caso, dirigido por Jean-Pierre Gorin, que fora parceiro de Godard no grupo Dziga Vertov (https://letterboxd.com/film/poto-and-cabengo/). Adoro com o nome "Cabengo" não possui etimologia, soando vagamente brasileiro ou africano, mas tendo vindo da mente de duas garotinhas (Alices afeitas à (des)construção (não em termos derridadianos, por favor) como a de Carroll?) nos cafundós dos EUA. Assim, então, repito: cabengocabengocabengo, HugoBallisticamente. E passo a pelota a quem quer que for ler essas avultosas folhas avulsas em pixel, futebolisticamente, onde vou preenchendo com o que for saindo de meus cabelos, cabendo nesse cabengo capenga.




Fenixologia: sobre ver filmes e perder poemas.

  Em algum momento, com quase 20 anos de idade, frustrado de não ter sido capaz (menos por incompetência, mais por desânimo e descrença em m...